Saturday, November 26, 2011

Poema de Sábado

Hope
Esperança

HOPE is the thing with feathers
ESPERANÇA é essa coisa com penas
That perches in the soul,
Que se hospeda na alma,
And sings the tune without the words,
E canta o som sem as palavras 
And never stops at all,
E nunca nunca para,

And sweetest in the gale is heard;
E o mais doce na ventania se ouve;
And sore must be the storm
E ferida deve estar a tempestade
That could abash the little bird
Por confundir o passarinho
That kept so many warm.
Que aqueceu a tantos.

I've heard it in the chillest land,
Pude escutá-lo nas terras mais frias,
And on the strangest sea;
E nos mares mais estranhos;
Yet, never, in extremity,
Porém, nunca, no desspero,
It asked a crumb of me.
Pediu-me sequer um grão.

Emily Dickinson,  
Emily Dickinson Poems, pag. 80

Thursday, November 24, 2011

The Metamorphosis (Franz Kafka)

Quando sentei para escrever sobre The Metamorphosis - A metamorfose, em português - fiquei pensando no que escrever. O que escrever sobre um livro que já foi falado, re-falado, analisado, comentado por anos e anos. A história é conhecida por todos, resumida em trocentos blogs pela internet afora. O que falar da obra?

Essa versão que comprei contem o manuscrito da história, a cópia dos diários de Kafka, as cartas trocadas por ele e Felice Bouer, sua noiva na época, e também com alguns amigos próximos, além de análises ou interpretações da obra.

"(...) uma vez que os outros não conseguiam entender o que ele falava, não os ocorreu, nem mesmo à irmã, que ele entendia o que diziam, e assim ele teve que se satisfazer, quando sua irmã estava no quarto, a ouvir ocasionalmente, apenas seus suspiros e apelos aos santos." (pag. 19)

No final já estava saturada do texto. Honestamente, tornou-se um pouco irritante ler a análise de cada linha da história, desmembrando os parágrafos para traduzir o significado de cada palavra escrita pelo autor. A história é curta e simples, de linguagem universal, e embora eu tente entender o motivo de se querer entender o porque de Kafka escrever uma história tão metafórica e intrínseca, tantas inferências acabam distanciando a história do conceito original.

... Gregor Samsa é o filho mais velho e provedor da família, acorda certo dia para descobrir seu corpo em transformação, em poucas horas se torna um besouro. A família envergonhada o tranca em seu quarto, a irmã que até então era seu maior orgulho, trata-o com pena no início, talvez por acreditar que a transformação fosse temporária, mas não demora muito e a lástima transforma-se em aversão, desgosto. Excluído do convívio familiar, motivo de repulsa, e não mais útil para os seus, Gregor vai definhando aos poucos, até o dia que é encontrado seco pela empregada. A família se livra de Gregor, finalmente, e assim a vida continua.

"'Meus queridos pais', disse sua irmã e como introdução bateu com o punho na mesa, 'as coisas não podem continuar como estão. Talvez não percebam, mas eu percebo. Não vou pronunciar o nome do meu irmão na frente deste monstro, portanto tudo que tenho a dizer é: temos que tentar nos livrar disto. Temos feito tudo humanamente possível para tomar conta dessa coisa e suportar isto; não acredito que ninguém vá negar o que esforço que fizemos.'" (pag. 37)

O final é triste e estranho. Lendo os diário de Kafka, nem ele mesmo estava feliz com o resultado final, e tantas e tantas vezes criticou a história. No entanto, Gregor me parece ser a personificação de Kafka e suas frustrações familiares, em que ele mesmo se sentiu minúsculo diante das imposições da família que o obrigada a fazer o que desgostava. No fim, Kafka quis mesmo chocar, seu intuito era o de criar uma história "infinitamente repulsiva". E na minha opinião, ele realmente conseguiu.

Monday, November 21, 2011

The Secret Life of Bees - A Novel (Sue Monk Kidd)

Outro livro da lista da Rory Gilmore, yey! Esse foi um dos poucos livros que li após assistir o filme. O filme até que é fiel ao livro, em sua maioria, mas romantiza ou ameniza momentos cruciais da história. Não entendi o porque de escolherem a loirinha Dakota Fanning como Lily Melissa Owens, talvez para reforçar o conflito racial que acontece na história?


"Minha primeira e única memória da minha mãe é do dia que ela morreu. Tentei por muito tempo formar uma imagem dela de antes, pelo menos um pedacinho, como quando ela me levava pra cama, lia as aventuras do Tio Wiggly, ou pendurava minhas roupas perto do aquecedor nas manhãs congelantes." (pag. 5)


Passada em 1964 na Carolina do Sul, a história narra o drama familiar de Lily Owens, perseguida pela dúvida de ter ou não ter acidentalmente assassinado a mãe quando criança. Com um pai bruto e indiferente, Lily é criada pela babá negra Rosaleen.

Pausa na história para analisar o período histórico. 1960 foi um período marcado por manifestos contra a segregação racial. Apesar de não ser o centro da história, a narrativa faz referência ao apartheid americano, a violência cometida contra negros pelo KKK (Ku Klux Klan), e os movimentos contra a segregação que culminaram com a aprovação do Ato dos Direitos Civis de 1964.

Quando Rosaleen tenta exercitar seu mais novo direito adquirido de votar, é espancada e presa pelos brancos racistas da cidade. Lily Owens sabe que a vida da criada corre perigo, e buscando ela mesma livrar-se das crueldades de T. Ray, fogem da cidade em direção a Tiburon, cidadezinha da qual nada sabem, com exceção de que é a cidade estampada na foto da Madonna Negra encontrada na caixinha com os únicos pertences restantes da mãe de Lily, Deborah.

São acolhidas pelas irmãs Boatwright, August, June e May, criadoras de abelhas e adoradoras da Madonna Negra. August é a mãezona, prudente e sábia, respeitada na comunidade, é lider do grupo de adoradoras. Mesmo sendo uma mulher forte, ela mantém sua feminilidade, e lê Charlotte Bronte; June esconde um rancor pelos homens, seus sentimentos são expressos através de seu violino, a dor interna é aclamada em forma de música; May carrega os sofrimentos do mundo em seus ombros, ela ama a tudo e a todos, e não suporta as injustiças e a falta de amor do mundo. Ela é doce, é inocente, e para suportar suas dores, escreve-nas e as esconde em seu próprio "muro das lamentações".

"Pode-se dizer que nunca tive um momento verdadeiramente religioso, daqueles que você sabe que há uma voz falando diretamente com você, que te fala tão genuinamente que é como se as palavras brilhassem nas árvores ou nas nuvens. Mas eu tive um momento desses bem ali, em pé no meu próprio quartinho comum. Escutei uma voz que dizia, Lily Melissa Owens, seu pote está aberto." (pag. 41)


Com as irmãs Boatwright, Lily aprende não apenas os segredos da vida das abelhas, mas também o poder da transformação através da paciência e do amor. A cura de feridas como perda, traição e a falta de amor. A história traz personagens femininos fortíssimos, e esses mesmos personagens se juntam para curar suas feridas, cuidando uma das outras e criando um santuário com valores familiares e respeito, um verdadeiro lar. A importância de escolher o que realmente importa.


Como mencionei, a história traz personagens femininos fortes, em contrapartida, não há nenhum personagem masculino positivamente forte - o que foi motivo de crítica a obra pela platéia masculina. Além do pano de fundo de cunho político, a história tem também um forte apelo religioso, o que me incomoda um pouco em romances. Quando citei acima que o filme romantiza alguns pontos críticos da história, refiro-me especialmente ao final do filme que foi alterado. T. Ray é cruel do início ao fim, e apesar de o filme tentar transmitir uma mensagem de esperança, de que as pessoas suavizam, mudam, não é isso que acontece na versão original.

"A maioria das pessoas não têm idéia da vida complicada que acontece dentro de uma casa de abelhas. Abelhas têm uma vida secreta sobre a qual não temos a menor noção. (...) Eu amei a idéia de as abelhas terem uma vida secreta, do mesmo jeito que eu estou vivendo." (pag. 148)


Friday, November 18, 2011

Persuasion (Jane Austen)

Não sei se é impressão minha, mas quanto mais tempo eu passo sem ler Austen maior impacto suas obras causam em mim... ok, talvez impacto não seja a palavra correta, mas o que quero dizer é que quanto maior o intervalo de tempo entre a leitura de uma história de Austen e outra, melhor proveito eu tenho da mesma.

Digo isso porque li minha última obra em 2009, ano em que li dois de seus livros quase que seguidos - Sense and Senbility - Razão e Sensibilidade, Pride and Prejudice - Orgulho e Preconceito - e apesar de eu amar de paixão Pride and Prejudice, covenhamos que as histórias têm uma similaridade, acabou que não fiquei muito fã de Sense and Sensibility no final das contas.

Daí decido esse ano ler Persuasion - Persuasão em português, e que diferença fez esse tempo longe. Senti saudades, Jane! Sentimento esse que só se descobre após um período de ausência. Li a história com tamanha intensidade que até senti os arrepios, prendi a respiração e as lágrimas vieram quando Anne Elliot finalmente descobriu a verdade sobre os sentimentos do Capitão Wentworth. Lembrei quão delicioso é ler Jane Austen. Repito, senti saudades, Jane!

A história é uma montanha-russa emocional, recheada de detalhes sobre as intrigas e dramas familiares ingleses. Anne Elliot e Wentworth se conheceram, apaixonaram-se, e juraram amor eterno quando adolescentes. No entanto, a família Elliot era tradicional e rica demais para aceitar o envolvimento de Anne Elliot com o desconhecido e não-nobre Wentworth. Os dois são separados, e por anos e anos nada se ouve falar em Wentworth.

Quando ele reaparece no mapa, já com o título de Capitão Wentworth, a família Elliot está decadente devido aos gastos excessivos do Sr. Elliot. Como medida desesperada para ajudar nas despesas, e ainda manter o status nobre, Elizabeth Elliot e o Sr. Elliot decidem mudar para Bath e alugar o casarão em Kellynch. A propriedade é alugada pelos Crofts, em pouco tempo Anne toma conhecimento que a Sra. Croft é na verdade irmã do Capitão Wentworth.

O encontro é inevitável, mas para surpresa de Anne, Wentworth mudou, era como se nunca tivessem se conhecido. Dois estranhos.

Logo, no entanto, ela começou a racionalizar consigo, e tentar sentir menos. Oito anos, quase oito anos se passaram, do dia em que tudo foi desfeito. (...) O que oito anos seriam capaz de fazer?
(...) Alas! com todo seu raciocínio, ela descobriu que para os sentimentos reprimidos oito anos podem ser quase que nada. Agora, como traduzir os sentimentos dele? (pag. 51)


Entre os jantares, passeios e encontros na casa dos Hayters e Musgroves, Anne Elliot observava discretamente o comportamento de Wentworth, e o desenvolvimento da amizade entre ele e Louisa Musgrove. Louisa com seu comportamento expansivo, falava abertamente sobre a vida da família, criticando o comportamento da cunhada Mary Musgrove (irmã de Anne), e é quando ela deixa escapar que o irmão havia pedido Anne Elliot em casamento mas ela o rejeitou, e havia rejeitado outros também, de acordo com o relato.

Quando o acidente com Louisa Musgrove acontece durante a viagem do grupo a Lyme, Anne tem a convicção de que os sentimentos de Wentworth não mais pertencem a ela. O desespero, a dor em sua face pela situação de Louisa convencem até mesmo Mary e Charles de que Louisa e Wentworth muito em breve seriam oficialmente um casal. Anne assiste a tudo calada, tentando esconder ou disfarçar sua angústia e desapontamento. Todos esses anos esperando por ele, a promessa feita não foi esquecida por ela, mas pelo que tudo indica, ela foi a única que realmente levou a promessa a sério.

Já em Bath, Anne ouve sobre o noivado de Louisa Musgrove o Capitão Benwick. Para a surpresa de todos, Wentworth partiu poucas semanas após o estado de saúde da moça melhorar, deixando claro que não havia relacionamento entre os dois. Não demora muito para que Charles Musgrove e a esposa Mary, também cheguem a Bath, e ouve-se que os Crofts também estariam chegando a cidade. Sr. Elliot que ainda não os conhecia, e já ciente da posição dos Crofts na sociedade, deixa claro que apresentaria o clã Elliot aos locatários de sua propriedade.

Mais jantares e encontros, Wentworth também chega a Bath, agora não mais o desconhecido da adolescência, até mesmo o Sr. Elliot busca conhecê-lo. O que ele não contava é que Anne estava sendo cortejada pelo primo bonitão William Elliot - aquele que a olhou da cabeça aos pés em Lyme num breve encontro, quando eles nem mesmo tinham conhecimento do grau de parentesco. Deixaria Anne Elliot se envolver pelas atenções de William? Rejeitaria Anne um outro pretendente segurando-se a uma promessa que parece ter sido guardada apenas por ela?  Ha, só lendo para descobrir.

"Anne não via nada, não pensava nada sobre o brilho do lugar. Sua felicidade vinha de dentro. Seus olhos brilhavam, seu rosto brilhava; porém ela não se dava conta disso. Ela pensava apenas sobre meia-hora atrás, e ao caminhar para seus assentos, seus pensamentos relembraram passo-a-passo o que aconteceu. (...) aquela raiva, ressentimento, repulsa, não mais existiam. (...) Ele a amava." (pag. 150)

Saturday, November 12, 2011

Poema de Sábado

Da perfeição da vida

Por que prender a vida em conceitos e normal?
O Belo e o Feio... O Bom e o Mau... Dor e Prazer...
Tudo, afinal, são formas
E não degraus do Ser!

Mario Quintana, Espelho Mágico
pag. 36

Friday, November 11, 2011

O Quinze (Rachel de Queiroz)

Ler Rachel de Queiroz é lembrar da minha adolescência, é lembrar das viagens de férias para o Ceará com minha avó e minhas primas. Como muitos nascidos no Norte do Brasil, eu sou descendente de nordestinos. Meu avó paterno nasceu em Juazeiro do Norte, por isso, minhas férias da escola tinham Ceará como destino certo, eram meses e meses em Fortaleza com viagenzinhas curtas para Juazeiro.

Antônio Torres resumiu brilhantemente a história em poucas linhas: "O embate entre o homem e a natureza, no trágico destino de um povo assolado pela grande seca de 1915 que, diga-se de passagem, não foi a última. Numa prosa simples, viva, comovente, Rachel de Queiroz tece seu relato em duas linhas de força: a história de um amor irrealizado da mocinha que lê romances franceses e sonha com o moço rude entregue à faina solitária de salvar o seu gado; e a dramática marcha a pé de um retirante e sua família, sonhando chegar ao Amazonas."

A mocinha é Conceição, que "tinha vinte e dois anos e não falava em casar. As suas poucas tentativas de namoro tinham-se ido embora com os dezoito anos e o tempo de normalista; dizia alegremente que nascera solteirona" (pag. 13); e o moço rude é Vicente, seu primo. Os dois haviam tido um romance na adolescência que foi rompido quando Conceição mudou para a capital para estudar e se formar no Magistério.

"Separava-os a agressiva miséria de um ano de seca; era preciso lutar tanto, e tanto esperar para ter qualquer coisa de estável a lhe oferecer!" (pag. 49)

O interessante na história desses dois é a falta de comunicação, o supor, o achar que é isso que o outro quer dizer e não conversar abertamente para esclarecer os fatos, baseando seu julgamento em especulações pessoais sobre as ações do outro. É como se ambos tivessem, no íntimo, a certeza de que ficariam juntos, mas nenhum dos dois teve a oportunidade ou talvez a coragem de verbalizar, a espera de que o outro desse o primeiro passo, e acaba que o passo foi dado pelos inúmeros fatores externos, distanciando-os a cada encontro.

A família retirante é a de Chico Bento e sua esposa Cordulina, e os cinco filhos pequenos. "Sem legume, sem serviço, sem meios de nenhuma espécie, não havia de ficar morrendo de fome, enquanto a seca durasse." (pag. 31) Decidido a partir para a capital e de lá seguir para o Norte, Chico Bento parte com a família em sua jornada a pé pelo sertão.

Ler O Quinze trouxe esse momento nostálgico, uma nostalgia doce e amarga ao mesmo tempo. Nas visitas a Juazeiro via pela janela do ônibus a paisagem de terras secas e áridas do interior do nordeste, a seca se faz sempre presente naquelas terras, não importa o ano que se visite, e ao ler o livro me veio a memória as casas de barro, a terra rachada, as crianças de pé no chão. Quão absorto alguém se sente ao ver essas imagens quando não se compreende ou sabe as dificuldades que os habitantes da seca passam... e ninguém melhor do que Rachel de Queiroz para escrever sobre o drama de retirantes nordestinos. Livro este que é o seu primeiro romance escrito aos 20 anos, publicado em 1930.

"E a criança, com o cirro mais forte e mais rouco, ia-se acabando devagar, com a dureza e o tinido dum balão que vai espocar porque encheu demais." (pag. 60)

Tuesday, November 8, 2011

Atonement (Ian McEwan)

Sei que tenho estado bem ausente do blog ultimamente, mas vou correr contra o tempo para comentar sobre todos os livros lidos esse ano antes do final de 2011. Ai, ai, espero que dê tempo!
Atonement - Reparação, em português - está na lista da Rory Gilmore, eis o motivo de sua presença aqui… então vamos a história.

O livro é dividido em três partes, com um capítulo extra que explica e fecha a história. A primeira parte introduz o leitor a família Tallis, família aristocrática residente de uma cidadezinha no interior da Inglaterra. E nossos protagonistas, os irmãos: Briony, a caçula e nossa narradora-personagem; Cecília, e Leon, o mais velho. E a história começa com a movimentação na residência dos Tallis em celebração ao retorno de Leon.

Briony escreve o roteiro de The Trials of Arabella a ser encenada pelos primos - Jackson, Pierrot e Lola - hóspedes por tempo indeterminado dos Tallis após o divórcio dos pais. Entre os atritos entre primos, a depressão da mãe, e seus delírios pré-adolescentes, Briony testemunha uma cena intrigante. Da janela de seu quarto ela vê Cecília e Robbie no jardim próximo ao chafariz, Cecília despindo-se e mergulhando no chafariz, depois diz algo a Robbie, e visivelmente abalada caminha em direção à casa sem olhar para trás, ele fica a admirar Cecília mas logo parte. Onde outrora existiam dois corpos, resta uma poça de água que logo seca com sol.

"Os homens removeram seus chapéus e esperavam por ela, sorrindo. Cecília se perguntou, como as vezes fazia quando era apresentada a um homem pela primeira vez, se esse seria aquele com quem iria se casar, e caso seria esse momento particular que se lembraria para o resto de sua visa—com gratidão, ou profundo arrependimento." (pag. 44)

Quando Robbie lhe entrega um bilhete endereçado a Cecília, Briony não pensa duas vezes antes de ler. Ela já corria longe quando Robbie realizou que o bilhete enviado era o errado, era o que deveria ter destruído, o bilhete com seus desejos eróticos mais íntimos. Quando Briony descobre Cecília e Robbie na biblioteca, seus olhos não sabem o que vêem, se aqueles corpos ferozes buscando um ao outro cometem um ato de amor ou crueldade. Imatura, Briony acredita que Robbie molestou a irmã e busca oportunidade para desmascará-lo.

A oportunidade vem quando Pierrot e Jackson fogem de casa. Durante as buscas madrugada a dentro, Briony flagra a prima Lola sendo atacada. No escuro apenas viu uma sombra, mas teve convicção de que tal ato só poderia ter um autor. Conta a Lola o que havia testemunhado na biblioteca, e acredita que se ele teve coragem de cometer tal ato com Cecília, com certeza o faria novamente com a inocente Lola.

"Ela quis gritar, mas não conseguiu fôlego, e sua língua parecia lenta e pesada. Robbie se movia de tal maneira que sua visão da a irmã estava bloqueada. Então Cecília lutou para se soltar, e ele a deixou ir. Briony parou e chamou o nome da irmã. Quando ela passou por Briony não havia sinais em Cecília de gratitude ou alívio. Seu rosto não tinha expressão, quase composto, e ela olhou diretamente em direção a porta pela qual saiu." (pag. 116)

Logo a notícia se espalha, a polícia é chamada, Briony expõe o que ocorreu com Cecília. Ao amanhecer, Robbie retorna a casa com os irmãos foragidos nos braços, mas suas explicações e os clamores de Cecília são em vão.

Parte dois começa com a II Guerra Mundial. Após anos na prisão, Robbie encontra-se perdido em meio aos bombardeios. Cecília cortou contato com a família após a prisão de Robbie e virou enfermeira da Cruz Vermelha, o relacionamento dos dois é resumido na troca de cartas cheias de esperança de um futuro incerto.

Briony busca reconciliação com a irmã, muda para Londres e entra na escola de Enfermagem com esse intuito. Não mais a menina imatura e mimada pela mãe, Briony reconsidera seus atos, relembra o passado e o tempo em que quando criança fora apaixonada por Robbie. Agora tem a certeza de que ele é inocente. Tentando reparar seu erro, busca Cecília para esclarecer os fatos. Como enfermeira, Briony testemunha uma realidade que jamais conseguiria transcrever em suas histórias. As novas experiências lhe dão estímulo, veracidade às suas palavras... Atonement é no final das contas, a história de Cecília e Robbie escrita por Briony.

Morte, desespero, dor, medo. São tantos sentimentos opressivos vividos durante o tenso período da guerra, e eles são todos transcritos em Atonement. Do desesperado instinto de sobrevivência de Robbie e seus companheiros, aos últimos minutos da mãe com o filho no colo antes da bomba atingi-los. Do sofrimentos dos soldados feridos, a compaixão das enfermeiras. McEwan tem um talento descritivo típico dos escritores europeus, e sua representação da vida campestre da típica família inglesa, com toda sua hipocrisia, fez-me lembrar Austen e Tolstoy. A história é muito bem escrita porém muitíssimo depressiva, pesada, perturbadora. E o final, ah, quem leu por favor me diga o que achou...

"Através do bolso de seu casaco ele sentiu o amontoado de cartas. Vou esperar por você. Volta." (pag. 246)